A ideia de que uma relação possa transitar do fogo da paixão para as águas calmas de um casamento duradouro sem sobressaltos ou conflitos sérios é absolutamente válida… nos livros de contos de fadas! De um modo geral, uma relação de compromisso pressupõe partilha, intimidade e alguma discordância. Por outro lado, cada um dos membros do casal vai evoluindo e, queiramos ou não, a pessoa com quem casámos não pode ser a mesma ao fim de 10 ou 20 anos. À medida que o tempo passa e que os obstáculos surgem, é preciso encontrar ferramentas que nos permitam enfrentar os conflitos de forma inteligente.
As discussões conjugais são normais e, dentro de certos limites, também podem ser saudáveis (já o disse aqui). Mas é preciso que reconheçamos que há alguns padrões de comportamento que podem funcionar como autênticas facadas no coração da pessoa amada, nomeadamente:
HIPERCRITICISMO. Evite bombardear o seu cônjuge com tudo aquilo que, do seu ponto de vista, ele faz de errado. Eu tenho-me referido inúmeras vezes à importância de uma postura clara e honesta a propósito do que cada um sente.
Mas não confunda as coisas!
Fazer 20 críticas por dia ao seu parceiro está muito longe de ser uma forma emocionalmente inteligente de o confrontar com as suas necessidades. Essa postura não cria proximidade. Pelo contrário, cria mágoa, ressentimento e desmotivação.
DESPREZO. Se as suas queixas estão a ser responsáveis por uma agitação constante, levando-o(a) a assumir atitudes que permitam que o seu cônjuge se sinta desprezado, pare imediatamente! É tempo de esfriar a cabeça e reconstruir um olhar equilibrado relativamente à pessoa que está ao seu lado. Ele(a) tem defeitos e é possível que falhe muitas vezes mas está longe de ser merecedor(a) da sua ironia e do seu sarcasmo. Mais uma vez: não confunda as coisas! Ser sarcástico enquanto se queixa do comportamento do seu cônjuge não é a mesma coisa que usar o humor para fortalecer uma relação. Esteja atento(a). Se a pessoa que está ao seu lado se mostra incomodada, é melhor repensar a sua comunicação.
POSTURA DEFENSIVA. Como é que habitualmente reage às queixas do seu cônjuge? É capaz de assumir a responsabilidade pelos seus erros? Ou, pelo contrário, procura contra-atacar apontando as falhas dele(a)? Quando o seu companheiro se queixa, evite transformar a chamada de atenção num braço de ferro. Não tente “ganhar” a discussão provando que ele(a) não tem razão. Assuma a sua parte. E procure mudar para ir ao encontro das necessidades dele(a).
AMUO. Pensava que só as crianças é que faziam birra? Era bom… Os adultos às vezes sentem-se profundamente magoados e fecham-se na sua concha, recusando-se a continuar a discutir. Fazem-no muitas vezes numa tentativa de que o cônjuge se aperceba da dor que provocou. Mas este comportamento é uma das piores coisas que se pode fazer numa relação. Se se sentir dominado pela ativação fisiológica, pare a discussão, sim. Isso protegê-lo-á de uma explosão. Mas retome o assunto quando se sentir mais calmo(a).
Se você estiver capaz de reconhecer que usa com alguma frequência um destes padrões de comportamento, fique atento(a). É possível que a sua relação esteja em risco.
NÃO USE UM DISCURSO DESTRUTIVO.
O seu cônjuge não é seu adversário. Há um “Nós” que merece ser preservado. O uso de expressões como “Tu nunca…” ou “É sempre a mesma coisa…” é potencialmente devastador. Seja positivo(a). Identifique aquilo que o seu cônjuge é capaz de fazer bem, empatize com as suas dificuldades, dê-lhe ânimo, mesmo quando sente necessidade de se queixar. Estruture a sua reclamação de forma empática dizendo algo como “Eu sei que não fizeste por mal e que nos últimos tempos tens dado o teu melhor para chegar a horas mas não gostei que te tivesses atrasado para ir buscar os miúdos à escola” em vez de dizer simplesmente “És um irresponsável”.
ACEITE ESTE FACTO:
NEM TODOS OS PROBLEMAS TÊM SOLUÇÃO.
Já terá ouvido dizer que não há relações perfeitas, certo? Isso implica que até aqueles casais que se habituou a admirar tenham os seus problemas. Em muitos casos são assuntos sérios que não podem ser resolvidos. Para que a relação desse certo, os membros do casal escolheram aceitar o problema ou simplesmente geri-lo. Se a sua relação for suficientemente importante para o(a) levar a desejar que dure para sempre, terá de dar o seu melhor neste sentido. Você não vai conseguir mudar a pessoa que tem ao seu lado e alguns dos seus defeitos vão continuar a existir. Então, o melhor é abdicar dos braços de ferro e adaptar-se. Gerir os problemas não significa acomodar-se. Significa que está disponível para tolerar algumas falhas e negociar.
BRUTALIDADE? NÃO, OBRIGADA.
Há algumas coisas que o seu cônjuge faz que o deixam com os nervos em franja. Nessas alturas apetece-lhe fazer “saltar a tampa”, dar dois berros. Se o fizer a título pontual, é possível que não haja grandes danos. Mas se essa for – aos olhos do seu cônjuge – a sua imagem de marca no arranque de qualquer discussão, então a sua relação está em risco. Ninguém se sente motivado para mudar quando do outro lado está alguém permanentemente enfurecido.
Esteja atento à sua comunicação não-verbal. É frequente revirar os olhos, cruzar os braços ou desviar o olhar enquanto ouve o que o seu parceiro tem para dizer? Então, tenha cuidado. A raiva pode estar a tomar conta da sua comunicação, levando-o(a) a encarar o seu cônjuge como um adversário, mais do que como o seu maior aliado.
APRENDA A CEDER.
A escolha é sua: você quer ter razão ou quer ter uma relação? Se as suas discussões conjugais se transformam regularmente em braços de ferro em que você acaba a desabafar com familiares ou amigos sobre o facto de “ter razão”, então é possível que não esteja a fazer as escolhas mais inteligentes de modo a garantir que a sua relação dê certo.
A vida a dois é feita de cedências e estas têm de ser extensíveis aos assuntos mais significativos. Para que a sua relação continue a ser tão satisfatória para si quanto para a pessoa de quem gosta, ambos terão de “perder”. Se o seu cônjuge cedeu numa decisão que era importante para ambos, agora é a sua vez de o fazer. Disponibilizar-se para “perder” em nome da relação implica passar a mensagem “Eu gosto de ti a este ponto”.
PEÇA DESCULPA.
Para que uma relação dê certo às vezes é preciso engolir o orgulho e pedir desculpa pelos próprios erros. Por que me refiro a engolir o orgulho? Porque é preciso humildade e coragem para dar a mão à palmatória quando, ao mesmo tempo, nos sentimos feridos por aquilo que o outro possa ter dito.
Um pedido de desculpas genuíno é uma arma poderosíssima, capaz de baixar de forma significativa os níveis de tensão. Mas tenha cuidado: não peça desculpas apenas para agradar ao seu cônjuge. Se não for sincero(a), os sarilhos serão ainda maiores.
Quando sentir maiores dificuldades em utilizar estas estratégias, lembre-se do essencial: a pessoa com quem discute continua a ser aquela com quem você deseja ficar. Ele(a) continua a ser a pessoa magnífica que escolheu para fazer esta (nem sempre fácil) caminhada.