Quando se fala de violência doméstica fala-se quase sempre de um padrão relacional caracterizado pela opressão. De facto, a maioria das queixas relacionadas com esta temática envolvem agressores homens que, de forma mais ou menos continuada, exercem violência física e psicológica sobre mulheres cuja autoestima está enfraquecida. Numa parte considerável destes casos, a par da dependência emocional, é a dependência financeira da mulher que a "obriga" a manter-se naquela relação.
Nos últimos anos tenho recebido cada vez mais pedidos de ajuda
associados a discussões de casal marcadas pela
escalada de agressividade e pela
VIOLÊNCIA MÚTUA.
São homens e mulheres que se queixam de não saber travar as discussões e que vivem relações muito tumultuosas que, aparentemente, querem manter. São jovens namorados com quase nada que os prenda do ponto de vista formal; mas também são pais e mães que expõem os filhos a discussões claramente traumáticas e potencialmente fatais.
Quando chegam até ao meu consultório estes casais carregam quase sempre muitas mágoas, a par da vontade de restaurar a relação. Como é fácil de imaginar, estes não são processos terapêuticos simples. Envolvem, antes de mais, a tomada de consciência da disfuncionalidade deste padrão relacional, mas também a exploração da história de vida de cada um dos membros do casal e a identificação daquilo a que chamo os ciclos de vulnerabilidade. Na prática é preciso que cada um seja capaz de reconhecer as suas feridas emocionais, aquilo que os marcou e que, mesmo que de forma automática e inconsciente, poderá estar a condicionar a relação atual. Além disso, é fundamental que o processo terapêutico permita o desenvolvimento de competências que potenciem a assunção da própria responsabilidade.
É na medida em que ambos sejam capazes de assumir de que forma contribuem ativamente para os ciclos viciosos que marcam a violência da comunicação que é possível mudar. De facto, a mudança requer que os erros sejam assumidos pela própria pessoa, por oposição à troca de acusações. Culpar o outro pelos erros cometidos pelo próprio é meio caminho para que tudo fique NA MESMA.
Mas é possível mudar?
Pode uma relação onde haja violência física transformar-se numa relação saudável?
SIM, MAS…
Nem todas as pessoas são capazes de mudar. Nem todas as relações resistem às marcas que ficam dos episódios de violência. E, sobretudo, nem todos os pedidos de ajuda traduzem a real consciência de que a escalada de violência é um problema sério de que ambos são responsáveis e que ambos podem travar.
O medo de perder o cônjuge, a dependência emocional e a escassez de outros laços afetivos levam a que em muitas destas relações os membros do casal vivam demasiado fechados sobre si mesmos, alheios ao resto do mundo e, por isso, incapazes de se comprometer com a mudança.
Aqueles que conseguem inverter o jogo das probabilidades têm em comum a capacidade para assumir os erros, a vontade genuína de fazer com que as coisas resultem, o compromisso com as mudanças necessárias (e com os esforços associados) e uma rede de suporte que os ajude a manter o sentido de “normalidade”.