A chegada do primeiro filho é cada vez mais tardia. A maior parte dos jovens adultos opta por concluir o percurso académico, estabilizar profissionalmente e explorar o mundo através de viagens antes de partir para esta etapa do ciclo de vida. Reconhecem que o nascimento do primeiro filho corresponde a um período de muitas mudanças, algumas difíceis, e optam por viver algum tempo a liberdade que a vida a dois oferece.
Mas ainda que esta etapa esteja envolta numa
imensa carga de trabalhos,
a verdade é que uma percentagem significativa dos casais opta por ter filhos e reconhece neste passo uma espécie de realização pessoal.
Mais: para muitos, uma relação amorosa só se transforma em família aquando da concretização deste sonho. É verdade que vivemos numa era em que todos os dias surgem novas formas de família mas o modelo tradicional continua a vigorar nos sonhos da maior parte dos adultos.
Ao contrário do que acontecia até há alguns anos, aquela que é para muitos a etapa mais bonita do ciclo de vida é também reconhecida como
uma fonte de conflitos, um teste à estabilidade do casal.
A maior parte dos jovens casais sabe que quando passarem a ser 3 terão de abdicar de muitos prazeres, horas de sono e de uma parte significativa da liberdade a que estão habituados.
Mas ninguém está verdadeiramente preparado para ter filhos.
Ninguém conhece antecipadamente a extensão daquilo que muda nesta fase da vida. Ninguém espera passarTANTAS noites em claro. Ninguém está preparado para gerir os cuidados prestados à criança, a lida da casa, as relações familiares, as obrigações profissionais e ainda continuar a alimentar o amor romântico.
Aparentemente há casais que são mais bem-sucedidos na difícil tarefa de manter um casamento feliz depois do nascimento do primeiro filho e importa perceber os recursos que os distinguem dos outros, daqueles que evidenciam mais dificuldades, acabando tantas vezes por entrar numa crise conjugal.
Que recursos são esses?
GOSTAR VERDADEIRAMENTE DO CÔNJUGE. Pode parecer redundante mas, para que um casamento dê certo e sobreviva à árdua etapa do nascimento do primeiro filho é fundamental que os membros do casal gostem MESMO um do outro. Mas não é sempre assim? – perguntar-me-ão. Não. Nem todas as pessoas casam/ decidem ter filhos com o amor da sua vida. Nem todas as pessoas amam verdadeiramente o seu cônjuge. Algumas resignam-se a relações antigas porque temem não ser capazes de encontrar alguém que realmente as preencha; outras apressam-se a assentar com medo de não irem a tempo de cumprir o sonho da maternidade/ paternidade (em função da idade). E, claro, ainda há casais que optam por ter filhos numa tentativa irracional de dar uma lufada de ar fresco a uma relação que há muito tempo esmoreceu.
PARTILHA DAS TAREFAS DOMÉSTICAS. Há uma probabilidade mais elevada de os membros do casal superarem as adversidades do nascimento do primeiro filho se tiverem adquirido previamente algumas competências a este nível. O facto de saberem trabalhar em equipa, distribuindo afazeres, é meio caminho andado para que estejam em sintonia e a comunicação flua melhor. Isso inclui serem capazes de reconhecer que há tarefas que um desempenha melhor/ mais rapidamente do que o outro, cumprirem com os acordos efetuados, estarem atentos às necessidades do outro, prestarem muita atenção aos apelos que são feitos e gerirem com inteligência o tempo de cada um.
BOM SEXO. Exceção feita aos primeiros dias pós-parto, em que há desconforto físico da parte da mulher, não há nenhum motivo prático para que os membros do casal se afastem do ponto de vista sexual depois do nascimento do primeiro filho. Pelo contrário, o papel parental deve ser claramente distinto do papel conjugal e ambos têm de continuar a ser alimentados, sob pena de um substituir o outro. E todos sabemos o que acontece aos casais que deixam de namorar centrando-se em exclusivo no papel parental. Não é fácil estar disponível para a intimidade sexual quando mal se dorme duas ou três horas seguidas, tal como não é fácil pensar na hipótese de deixar um bebé pequenino aos cuidados de terceiros mas a verdade é que quanto mais cedo os membros do casal criarem rotinas que lhes permitam continuar a namorar, melhor. Isso pode incluir deixar o recém—nascido com os avós uma noite por semana, sem sentimentos de culpa, e aproveitar para fazer um programa a dois, sem baba, nem fraldas, nem chuchas.
APOIO DA FAMÍLIA E DOS AMIGOS. Nem todos os casais têm o privilégio de poder contar com o apoio de uma rede social REAL, sólida, cooperante. E os que a têm nem sempre são capazes de delegar, de pedir ajuda. Por vergonha, por vontade de mostrar ao mundo que são a família perfeita, o casal perfeito, o super-homem e/ou a super-mulher, muitas pessoas optam por acumular tarefas, fechando-se sobre o seu núcleo e resistindo à ajuda externa. Infelizmente, são muitos os casais com quem já trabalhei que não resistiram a esta escolha e viveram autênticos pesadelos. Quando, por exemplo, uma mulher me diz em sede de terapia que chegou a desejar desmaiar em plena rua “só” para que uma ambulância a viesse buscar e pudesse, assim, descansar um par de horas, estamos perante escolhas emocionalmente pouco inteligentes. Quanto maior for a nossa capacidade de entreajuda, maior a probabilidade de nos sentirmos seguros.
BOA BASE FINANCEIRA. Não há volta a dar: ter um filho custa dinheiro e a velha máxima “Onde comem 2, comem 3” é demasiado redutora e pode conduzir a problemas sérios entre os membros do casal. É verdade que, se fizéssemos as contas com rigor, quase ninguém teria filhos – porque há muitas despesas fixas mas, sobretudo, porque há muitos imprevistos. Mas a decisão de ter um filho não deve (não pode) ser tomada de ânimo leve. Se um dos membros do casal estiver desempregado e/ou se a família estiver a atravessar um período complicado em termos financeiros, a chegada de uma criança pode representar o rastilho para uma explosão de dificuldades e a relação pode não resistir.
TEMPO PARA A FAMÍLIA. É preciso tempo de qualidade – não só para os filhos, mas para a família no seu todo. Se um dos membros do casal passa longos períodos fora de casa e/ou vive em função do trabalho, as coisas até podem funcionar a 2 mas há pouca probabilidade de continuarem a funcionar a 3.