Tal como já tenho tentado explicar noutros textos, as famílias reconstituídas enfrentam desafios diferentes daqueles por que passam as famílias tradicionais. De um modo geral, os primeiros anos são mais turbulentos, principalmente devido à multiplicidade de laços afetivos envolvidos. Sendo essencial em qualquer relação amorosa que os membros do casal se esforcem por mostrar que o cônjuge é muito importante para si e que aquele projeto familiar está no topo das suas prioridades, isso é muito mais difícil quando há filhos e ex-maridos ou ex-mulheres envolvidos.
Uma das questões que mais frequentemente abala a segurança das pessoas que se envolvem romanticamente com alguém com filhos de uma relação anterior diz respeito à hierarquização das prioridades. Nas famílias tradicionais, a questão não se coloca normalmente assim. Os filhos são, para a maior parte das pessoas, a maior prioridade e, ainda que possa ser difícil conciliar o papel parental com o papel conjugal, de uma maneira geral todas as pessoas se sentem orgulhosas do seu cônjuge quando este coloca os interesses dos filhos acima de tudo.
Mas o que é que acontece quando uma pessoa
sente que aparece SEMPRE em segundo plano?
O que é que acontece quando a relação conjugal (segundo casamento) é aparentemente prejudicada pelo facto de o membro do casal que tem filhos de outra relação colocar os seus interesses acima de tudo? A insegurança cresce, bem como os problemas:
Cobranças.
Discussões.
Ressentimentos.
Como não há uma fórmula universal para lidar com estes desafios, e, sobretudo, porque dificilmente existirá uma vítima e um culpado nestas histórias, importa que cada um procure empatizar com as necessidades e vulnerabilidades do outro, olhando para lá do óbvio. Se uma mulher se sentir insegura porque o seu marido (ou namorado) não é capaz de valorizar na medida certa os eventos que, para ela, são significativos, mas não arrisca ausentar-se nos compromissos que assume com os filhos, é possível que sinta que, para o companheiro, aquela relação não é assim tão importante.
No entanto, estes casos merecem uma leitura mais atenta, já que, muitas vezes, aquilo que está em causa é a insegurança daquele pai que, vendo os seus filhos apenas de 15 em 15 dias, não constrói uma ligação tão segura quanto o faria numa família tradicional. De resto, é precisamente isso acontece com muitos progenitores que se veem forçados pelo tribunal a resumir o contacto com os filhos a estas visitas esporádicas – a pessoa passa a dar tudo para que aqueles momentos sejam especiais, mesmo que, para isso, tenha de cometer alguns erros, como não ser capaz de dizer não às crianças, por exemplo.
Neste exemplo prático, como em muitos outros, bastará que os membros do casal invistam no diálogo sincero e procurem aceder àquilo que está por detrás da aparente negligência/ desvalorização da relação. Na medida em que uma mulher perceba que o companheiro se sente inseguro no papel de pai, ser-lhe-á mais fácil apoiá-lo, elogiá-lo e, claro, condescender num ou noutro episódio. Claro que isso não deve implicar anular as suas próprias necessidades. De resto, estas têm de continuar a ser atendidas, para que o papel parental não anule o papel conjugal, sob pena de a relação não subsistir, apesar da empatia.