A depressão pode ter um efeito devastador sobre as relações amorosas. Em sede de terapia confronto-me quase todos os dias com pacientes que se culpam por não sentir o mesmo pelos seus parceiros; ou que culpam os parceiros pelo vazio que sentem. É aflitivo vê-los transformar-se em blocos de gelo na própria relação.
Depois de anos de carinho e de intimidade,
como é que estas pessoas podem, de repente,
dizer que não sentem amor ou, pior ainda,
que nunca amaram os respetivos cônjuges?
A verdade é que as pessoas deprimidas podem recusar-se a enfrentar a dor interior que está por detrás da suposta ausência de sentimentos. Em vez de procurarem tratamento, muitas passam a acreditar que é a relação existente que está a arruiná-las. Então, a resposta é muitas vezes sair da relação e encontrar a felicidade noutro lugar.
As consequências específicas da depressão serão diferentes em cada relacionamento, mas este é um dos problemas que eu ouço com mais frequência no consultório. Quando falo sobre o sofrimento interior destes pacientes refiro-me ao desespero, a uma dor insuportável e sem explicação da qual o paciente procura escapar tão depressa quanto possível. Como a depressão é uma perturbação que pode implicar oscilações de humor diárias, tudo se torna mais confuso.
Mas há outra consequência da depressão que pode conduzir à ideia de que a fuga é a melhor resposta:
A ANEDONIA.
É o que faz com que as pessoas deprimidas digam que já não amam ou nunca amaram os seus parceiros. A anedonia é a incapacidade de sentir prazer ou interesse por qualquer coisa. Para muitos é uma espécie de apatia, de falta de entusiasmo. Em função deste sintoma da depressão muitas pessoas acreditam que é a relação amorosa que as está a condicionar. De repente, a relação tornou-se oca, deixou de ter a intensidade esperada.
E, então, parece que a felicidade só pode ser reencontrada pela paixão por outra pessoa. A pessoa agarra-se à fantasia do companheiro perfeitamente apaixonado e da atração constante.
Quando alguém me pede ajuda porque está convencido de que o seu casamento está morto, assumo sempre a possibilidade de existir uma depressão ou outro transtorno de humor. A verdade é que a anedonia é muitas vezes a causa da vontade de largar tudo e de tentar encontrar uma vida nova e mais intensa. O problema é que o paciente com depressão "precisa" de um nível muito elevado de excitação para sentir o que quer que seja. "Precisa" de emoção e paixão.
Note-se que estas pessoas muitas vezes acreditam que estão perfeitamente capazes de sentir. Afinal, nalguns casos até conseguem sair e divertir-se com os amigos. Conseguem sentir-se apaixonadas por outras pessoas. O problema é que só se sentem bem precisamente porque estas experiências oferecem níveis excecionalmente altos de estimulação. É também por isso que, nalguns casos, estas pessoas podem recorrer a comportamentos aditivos como o uso de drogas recreativas, jogo, álcool ou pornografia.
Na prática tratam-se sempre de escolhas fantasiosas
que traduzem a vontade de fugir para uma vida
cheia de intensidade e de novidade,
como se essa fosse a resposta perfeita para o seu vazio interior.
NÃO É.