Ao receber o diagnóstico de cancro da mama, uma doença que pode ser mortal, é natural que a mulher se concentre mais nas estratégias para fazer face à doença do que no impacto que esta terá noutras áreas da vida, como a sexualidade. Mas a verdade é que há questões que merecem ser abordadas, já que o que está em causa é a possibilidade de surgirem alterações profundas na sexualidade, quer durante o tratamento, quer após a cura.
Para algumas mulheres a vida sexual passa para o fim da lista de prioridades, pelo que, mesmo que haja necessidade de promover a intimidade conjugal, isso pode não passar pela sexualidade; mas para outras a manutenção de uma vida sexual regular dá-lhes maior sensação de controlo e “normalidade” durante o tratamento.
Independentemente das características de cada mulher, é possível falar de três tipos de alterações:
• Dor (na zona genital ou noutras partes do corpo).
• Ansiedade e receio da intimidade.
• Impossibilidade de continuar a vida sexual devido à preocupação com a doença.
Como os tratamentos para o cancro da mama podem ser dolorosos, é natural que a mulher possa não ter energia ou disposição para investir na sexualidade. Neste caso, os analgésicos constituem um recurso importante, ainda que a ideia de os tomar antes de cada relação sexual possa condicionar a espontaneidade e o desejo. Outra estratégia para contornar as dores resultantes da cirurgia ou da radioterapia consiste na leitura – a dois – do Kamasutra. Com criatividade, o casal pode manter a sua vida sexual activa, evitando posições que possam agravar a dor física.
A quimioterapia e a radioterapia também são responsáveis pela sensação quase permanente de fadiga. Importa que a mulher seja capaz de reconhecer os seus actuais limites físicos e que coloque de parte toda a pressão. Mesmo que antigamente estivesse habituada a investir energicamente nesta área da conjugalidade, agora é preciso abrandar e, se necessário, reduzir a actividade sexual sem culpas. À medida que o tratamento vai evoluindo, os níveis de energia voltam ao normal e, consequentemente, a sexualidade também.
Nalguns casos estes tratamentos podem favorecer o aparecimento de sintomas da menopausa – cansaço, alterações de humor, perda da elasticidade e secura vaginal. Estes sintomas variam de pessoa para pessoa e podem ser temporários ou permanentes. No caso de uma mulher jovem, é natural que haja maiores constrangimentos resultantes do aparecimento destes sintomas, ainda mais porque as mulheres com cancro da mama não podem recorrer à terapêutica hormonal de substituição. Hoje sabe-se que muitas mulheres optam por enfrentar a severidade destes sintomas recorrendo a artigos à venda em “sex shops”, nomeadamente lubrificantes, vibradores e dildos.
Como se sabe, a auto-imagem condiciona a satisfação conjugal. Ora, a experiência de um cancro da mama pode deixar marcas visíveis (temporárias ou permanentes), que vão desde a perda de cabelo e alterações no peso até às cicatrizes da(s) cirurgia(s) e remoção da(s) mama(s). Algumas mulheres pura e simplesmente evitam qualquer tipo de exposição do seu corpo perante o cônjuge – deitam-se sistematicamente mais cedo para que o marido não as veja enquanto tiram a roupa ou cobrem-se totalmente. Outras optam por esconder determinadas partes do corpo. De um modo geral, assumem que o companheiro sentirá repulsa pelo seu corpo. Mas os estudos com esta população mostram que a partilha destes medos e fragilidades acarreta mais vantagens do que desvantagens. Quanto mais honesto for o diálogo sobre estas inseguranças, maior será a probabilidade de o marido ser capaz de ir ao encontro das necessidades da mulher. Quando o casal não é capaz de falar sobre estas matérias, vale a pena considerar a hipótese de se recorrer à ajuda psicológica.
Para a generalidade das mulheres a reconstrução mamária constitui uma alavanca importante para recuperar a auto-estima e o desejo sexual.
No que diz respeito à ansiedade, ela é absolutamente comum entre mulheres com cancro da mama. É expectável que haja receio de que o cônjuge deixe de se sentir atraído ou que a preocupação com os tratamentos condicione o próprio desejo. Mesmo que a mulher não se sinta totalmente à vontade para partilhar os seus sentimentos com o marido, pode ser benéfico partilhá-los com um amigo ou até com um psicólogo. De facto, a abordagem do assunto com alguém “de fora” pode ser mais fácil.
Como nalguns casos pode surgir uma depressão, é importante estar atenta e pedir ajuda especializada. Claro que a depressão não condiciona apenas a sexualidade, pelo que importa que os sintomas associados aos tratamentos não sejam confundidos com os desta perturbação e que a resposta seja célere e eficaz.
É importante que a mulher evite fazer comparações com outros períodos da sua vida, já que isso só aumentará o desgaste e a frustração. Compete ao casal adaptar-se às novas circunstâncias e reinventar a sua sexualidade – através do diálogo claro e honesto e do recurso à ajuda especializada, se necessário. Importa lembrar que é preciso tempo para esta adaptação. À medida que o tempo passa, muitas mulheres assumem que a doença lhes trouxe um maior conhecimento acerca da sua própria sexualidade.