Muitas pessoas têm a esperança de encontrar a pessoa perfeita até ao fim da vida. Esta expectativa é, no entanto, demasiado irrealista. Se não, basta que façamos o exercício inverso: até que ponto estamos preparados para corresponder à totalidade dos desejos da pessoa amada? Além de não sermos perfeitos, um dos encantos da vida a dois passa precisamente por sabermos que o nosso cônjuge gosta de nós, apesar dos nossos defeitos. Mas a verdade é que algumas relações começam a degradar-se quando pelo menos um dos membros do casal percebe que a pessoa que está ao seu lado, afinal, não é perfeita.
Se o primeiro casamento terminar porque um dos membros do casal considera que o cônjuge não é o “príncipe perfeito”, e, depois disso, não for feita nenhuma aprendizagem no sentido de desmontar este mito, a probabilidade de insucesso no segundo casamento aumenta seriamente. Mais: este tipo de expectativas pode conduzir a uma colecção de relações frustradas e ao desencanto em relação ao amor.
As famílias reconstituídas enfrentam um risco que não existe nas famílias nucleares: a comparação entre os dois casamentos. A ansiedade e a insatisfação tendem a aumentar a partir do momento em que o membro do casal que está a viver a experiência pela segunda vez se apercebe de alguns sinais no comportamento do cônjuge semelhantes aos que desencadearam o primeiro divórcio. Por exemplo, uma mulher que se tenha divorciado de um marido que a agredia fisicamente poderá interpretar a elevação do tom de voz do companheiro como o primeiro indício de violência e, por isso, decidir afastar-se.
Mas a postura de “tolerância zero” não é compatível com o amor. Os membros do casal precisam de reconhecer que o seu passado não pode ser apagado, mas também não deve atrapalhar o novo relacionamento. O novo cônjuge merece a oportunidade de se dar a conhecer e, nesse processo, também erra. As diferenças e os conflitos não devem ser interpretados como obstáculos inultrapassáveis. Devem, antes, ser vistos como oportunidades de crescimento e de amadurecimento da relação.
Um dos fantasmas que mais “atormenta” os casais das famílias reconstituídas prende-se com o desconhecimento que cada cônjuge sente em relação ao passado do outro. Esta “lacuna”, em particular no que diz respeito ao primeiro casamento, é, para algumas pessoas, assustadora, pois representa a impossibilidade de conhecer de forma rica o companheiro.
É precisamente porque não partem do zero que a partilha da história de cada um é fundamental nos segundos casamentos. Caso contrário, o casal arrisca-se a constatar tardiamente que não possuem os mesmos valores e filosofias de vida.
A vontade de fazer um percurso a dois depende deste conhecimento, bem como da necessidade de concretizar a adaptação aos hábitos de vida de cada um. Mas atenção: a partilha acerca dos episódios do passado só é produtiva se, quem ouve, evitar fazer juízos de valor. Se um dos membros do casal decidir partilhar com o outro os erros cometidos no primeiro casamento, fá-lo porque confia na pessoa que tem a seu lado e porque está disposto a melhorar o seu comportamento. Se o cônjuge se apressar a criticá-lo, haverá um retraimento.
É importante que os membros do casal das famílias reconstituídas não se fixem nas experiências passadas e desenvolvam hábitos e princípios de vida próprios, evitando comparações sistemáticas com relações anteriores.