Qualquer processo de divórcio é mais doloroso quando há filhos. À perda e ao luto característicos da separação conjugal junta-se a angústia de ter que comunicar a decisão às crianças. Quando estas são muito pequenas, o casal pode sentir algumas dificuldades: a vontade de as proteger dos efeitos nefastos da separação pode levar ao adiamento sucessivo da “Conversa”. O que dizer? E como fazê-lo? Qual a melhor forma? Existirá, afinal, uma forma ideal?
Antes de mais, e sem rodeios, é importante assumirmos que este é um passo difícil, tanto para os pais, como para as crianças. Não há forma de o tornar indolor. No entanto, há algumas variáveis que podem facilitar ou dificultar o processo. Já tive oportunidade de referir aqui o exemplo de uma criança que descobriu que os pais se iam separar antes de estes fazerem a comunicação oficial. Esta ilustração permite perceber o quão importante é comunicar a decisão atempadamente às crianças.
Se a separação ainda não é uma certeza, isto é, se o casal está temporariamente separado ou se já houve outras saídas de casa antes, é contraproducente dizer aos filhos que os pais se vão divorciar. É importante que as reacções geradas por impulso sejam devidamente ponderadas, para que a precipitação dos adultos não magoe as crianças inutilmente.
Por outro lado, a partir do momento em que o divórcio é uma certeza, os pais devem preparar-se para contar aos filhos. As crianças confiam plenamente nos pais e, se perceberem que estes estão a esconder-lhes a verdade, sofrerão sozinhas e tenderão a confiar muito menos nos adultos em geral.
O facto de as crianças, nomeadamente as crianças pequenas, não se pronunciarem em relação ao tema não quer dizer que não saibam de nada. Nalguns casos as crianças decidem cooperar com o “jogo”, respeitando o silêncio dos pais. Percebem que o assunto é melindroso e adoptam uma postura protectora: se os pais não falam, elas também não. Este sofrimento solitário pode traduzir-se em reacções muito diferentes:
- Há crianças que se portam excepcionalmente bem, achando que detêm alguma culpa nesta desgraça;
- Outras manifestam a sua tristeza através de “dores de barriga”, birras inesperadas ou resistência à escola;
- Algumas crianças tentam “proteger” o progenitor que é visto como mais fraco – o que chora mais, o que foi traído, ou o que se mostra mais abatido com a separação.
- Também há crianças que “fogem” do assunto como quem foge do monstro papão.
Por isso, é importante que os pais se organizem em nome do bem-estar dos filhos e… CONTEM A VERDADE. Idealmente, “a” conversa deverá ocorrer quando todos os membros da família estiverem presentes. Claro que isto nem sempre é possível. A mágoa e o ressentimento podem impedir o casal de viver esta etapa a dois. Se tal não for possível, é importante que ambos digam mais ou menos a mesma coisa em momentos distintos.
Quanto mais novos forem os filhos, maior a necessidade de sentirem a segurança das decisões dos pais. Daí que seja importante contar-lhes as mudanças que aí vêm. Por exemplo, as crianças estão cada vez mais familiarizadas com processos de divórcio e podem conhecer casos de amiguinhos que tiveram que ir morar para longe por causa disso, ou que deixaram de contactar regularmente com um dos progenitores. Mas isso não quer dizer que estes medos sejam expostos claramente. Cabe aos pais tentarem antecipar estas dúvidas.
Isto também não quer dizer que a conversa só deve ocorrer quando todas as decisões de ordem prática estiverem tomadas! O essencial é transmitir aos filhos a ideia de que os pais serão capazes de resolver todas as questões, mesmo as mais delicadas. Assim, as perguntas mais polémicas não devem ser seguidas de “Não sei” mas de “Ainda não decidimos, mas vamos conversar sobre isso”, por exemplo.
Esta conversa (ou estas conversas…) deve(m) servir para lembrar às crianças que ELAS NÃO TÊM CULPA NENHUMA do que está a acontecer. Não vale a pena pensar que esta ideia é ridícula, ou que os “nossos” filhos não se lembrariam de tal coisa. Mais vale prevenir!
E por que não antecipar outros medos legítimos? Garantir às crianças que os dois progenitores vão continuar a acompanhá-las é um pilar fundamental. Mais do que nunca é importante assegurar-lhes que ambos vão marcar presença nas suas rotinas e nas diferentes actividades que compõem as suas vidas – escola, actividades de tempos livres, idas ao médico, mas também as refeições, a hora do deitar e a “ronha” em frente à televisão. O facto de os pais já não conseguirem viver juntos não deve implicar que os filhos percam o contacto regular com um deles, já que isso prejudicaria o seu desenvolvimento.
Já agora: as crianças pequenas podem sentir alguma dificuldade em lidar com os sentimentos contraditórios dos pais. Assim, é preferível dizer-lhes que “os papás já não conseguem viver juntos” em vez de dizer que “já não gostam um do outro da mesma maneira” ou que “já não gostam um do outro como namorados”.