Elizabeth Taylor tem surpreendido o mundo inteiro com as sucessivas decisões relativas à sua vida amorosa. O facto mais anedótico diz respeito ao número de casamentos, mas, à medida que o tempo passa, a actriz deixa de ser vista como uma aberração e é cada vez mais encarada como uma precursora. Provavelmente mais empenhada em viver a sua vida e menos preocupada com aquilo que os outros pensariam a seu respeito, ainda teve o destemor de casar duas vezes com o mesmo homem.
Mais uma vez, o tempo teima em ensinar-nos que estas bravuras não são “esquisitices” de vedetas e, actualmente, há muitas pessoas que passam pela mesma experiência.
Independentemente das causas que conduziram ao divórcio – imaturidade, problemas de comunicação, infidelidade, ciúmes, problemas financeiros - há muitas pessoas que sentem vontade de voltar atrás, transformando uma decisão aparentemente sólida num processo reversível. Aliás, a reversibilidade do divórcio começa a estar tão interiorizada quanto a hipótese de terminar um casamento. Vivemos “o momento” e, independentemente das alegrias e das tristezas, reconhecemos que amanhã tudo pode ser diferente. Definitivo? Só a morte.
Claro que esta cultura hedonista pode trazer alguns riscos, mas não é disso que me proponho falar. Não posso deixar de apoiar os casais que decidem voltar a apostar numa relação. Se se amam, por que não? O que importa é perceber os constrangimentos desta situação. Que dificuldades é que estes casais enfrentam? E o que é que devem fazer para que estas sejam superadas ou, pelo menos, geridas?
Antes de mais, importa perceber que nenhuma relação vive só de amor. A vida a dois envolve um esforço sistemático da parte de ambos para que se faça cedências importantes, envolve o investimento consistente no amor romântico e o reconhecimento de que a conjugalidade não deve aparecer no fim da lista de prioridades. Se os erros cometidos no primeiro casamento não forem trabalhados, dando lugar ao amadurecimento, os “vícios” de comunicação repetir-se-ão e a esperança será rapidamente substituída pela frustração do “dejà vu”. Os receios desta natureza costumam traduzir-se em namoros mais ou menos escondidos – as pessoas preferem certificar-se de que “é desta” e que não vão voltar a errar.
A ideia de passar por um segundo divórcio (ou separação) é aterradora – envolve, para lá da tristeza e do desapontamento, a vergonha e a dificuldade em assumir outro fracasso perante a família e os amigos. Se a segunda ruptura envolver a mesma pessoa, estes sentimentos podem ser exacerbados.
Daí que tantos casais decidam recorrer à ajuda especializada antes de assumirem que voltaram a estar juntos. Esta ajuda pode ir ao encontro das suas necessidades, permitindo-lhes explorar os erros do passado numa perspectiva de auto-responsabilização e optimismo. Se cada um for capaz de identificar as mudanças necessárias para contribuir para a satisfação do cônjuge, as hipóteses de reconciliação aumentam.
Neste processo existem dificuldades exteriores à relação conjugal que não podem ser esquecidas. Como se sabe, aquando de uma ruptura é natural que os membros do casal se sintam magoados e que cada um olhe para o outro como “mau da fita”. É praticamente inevitável que essas mágoas sejam partilhadas com pessoas próximas – alguns familiares e amigos. Ora, quando o casal decide tentar uma reconciliação pode ser confrontado com as afirmações proferidas no passado. Mais: é legítimo que os mesmos familiares e amigos que assistiram à deterioração da relação e a quem foram confiados alguns segredos confrontem aquela pessoa (que lhes é querida) com questões do tipo “Como é que podes pensar em voltar para ele(a) depois do que te fez?”. Quem serviu de ombro de apoio pode sentir-se no direito de questionar o aparente retrocesso, já que, de certeza, não quererá voltar a assistir a um processo de sofrimento idêntico.
Como em quase todas as questões importantes da vida, deve imperar o bom-senso. A pessoa que partilha os aspectos mais negativos da sua conjugalidade não o faz de ânimo leve. Fá-lo porque está a sofrer e precisa de exteriorizar as emoções mais negativas. Portanto, isto não pode ser visto como um erro. Mas o amigo ou o familiar que “cobra” também não está a errar: está a manifestar uma preocupação legítima.
Cabe ao próprio casal gerir estes danos laterais. À medida que o tempo passa e que têm oportunidade de arrefecer a cabeça, apercebem-se de que ambos erraram e que nenhum dos dois pode ser visto como um monstro. Havendo sentimentos fortes que os unam, é natural que se sintam progressivamente aptos a perdoar os erros do outro. E este processo só ficará completo se forem capazes de partilhar este amadurecimento com as pessoas a quem confiaram o “lado lunar” da relação.
O amor que estas pessoas voltam a sentir uma pela outra não é “contagioso”, ou seja, não apaga a visão que os familiares e amigos entretanto construíram acerca daquela relação. Mas a capacidade de perdoar e de reconhecer que ambos erraram deve ser suficiente para que quem está à volta do casal aceite as suas decisões. Com certeza que não será fácil para um sogro olhar para o genro depois de saber que este foi infiel. Mas caberá à filha partilhar com o pai a importância que a reconciliação, e o respectivo apoio familiar, têm para si. O amor e a vontade de reconstruir uma relação devem prevalecer sobre o rancor.
Não menos importante é a questão dos filhos: é natural que, nestas circunstâncias, o casal sinta receio de partilhar com os filhos o facto de estarem a fazer uma tentativa para reatar a relação. O medo de voltarem a falhar e, assim, provocarem mais sofrimento às crianças, pode levar a que os pais procurem esconder o namoro. Mas a experiência clínica tem demonstrado que é sempre preferível partilhar alguma coisa com as crianças ou adolescentes. Eles apercebem-se de bastante mais do que seria expectável, pelo que, se forem deixados ao abandono, isto é, sem explicações, terão maior margem para fantasiar.
P.S. Prometo escrever em breve sobre como comunicar eficazmente com as crianças acerca das dificuldades conjugais.